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COMENTÁRIOS DA LIÇÃO DA ESCOLA SABATINA

PRIMEIRO TRIMESTRE DE 2021


Lição 3 – 9 a 16 de janeiro de 2021

Quando nosso mundo desmorona

Sérgio Monteiro

Nesta semana estudaremos um dos textos mais controvertidos e mais conhecidos do livro de Isaías e o contexto no qual ele aparece: Isaías 7:14, o famoso texto sobre o Emanuel.

Três grandes temas emergem do capítulo 7: a descrença de Acaz, a identidade da mulher grávida e a identidade de seu filho.

A descrença de Acaz

O período do reinado de Acaz foi conturbado tanto interna quanto externamente. Internamente, a teologia de Judá e Israel sofria com as constantes lutas e invasões de povos estrangeiros, que causavam um questionamento quanto ao poder de Deus em cumprir Suas promessas feitas a Davi. Seria mesmo Deus capaz de proteger Israel e estabelecer o reino de Davi para sempre?

Externamente, a confederação siro-israelita que ameaçava Jerusalém trazia ao monarca a sensação de que seu mundo estivesse prestes a ruir. Uma vez que sua confiança em Adonai estava abalada, ele planejava buscar auxílio da Assíria, ao que Isaías se opôs veementemente, afirmando que o rei deveria confiar no Eterno e manter a calma.

Diante da relutância de Acaz em desistir dos planos políticos, o próprio Deus lhe ofereceu uma certificação de Sua Presença: ele poderia pedir qualquer sinal. A recusa do rei, aparentando piedade e temor ao Senhor, foi na verdade uma demonstração de sua descrença. Ele não acreditava verdadeiramente que o Eterno pudesse ou quisesse Se envolver com a crise enfrentada naquele momento e livrar Seu povo. Este era o “fato histórico” recente: Deus não havia lutado em favor de Israel/Judá, indicado que Ele os havia abandonado, ou não era efetivamente o Deus Todo-Poderoso. Nem sempre palavras de aparente piedade brotam de lábios que creem!

A virgem

O segundo ponto importante nesse capítulo é a identidade da mulher que conceberia. Existe divergência entre os estudiosos, sendo que há diferentes ideias sobre quem seria essa mulher: ela seria a esposa do profeta, ou a rainha, esposa de Acaz, ou uma mulher não mencionada, mas do tempo do profeta e, quase relegada ao ostracismo, há também a ideia de que essa jovem seria a mãe do vindouro Rei-Messias.

Para buscar a identidade dessa mulher, é preciso entender alguns termos-chave do texto. Primeiro, diferente de nossas traduções, que dizem que “a jovem concebeu e dará à luz”, o hebraico diz: “‘a almah grávida e que está por dar à luz”. Essa tradução parece indicar que a jovem, chamada de ´almah, já se encontrava grávida e a ponto de dar à luz o filho. Não obstante, a construção hebraica pode ser explicada como uma certeza profética, pois na mente de Deus e em Seu plano, o futuro declarado é visto como já realizado. Segundo, o termo ´almah, que descreve a mãe de Emanuel, é um termo escasso na Bíblia hebraica, ocorrendo apenas 9 vezes, considerando singular e plural. Muitos estudiosos têm apontado que em nenhuma dessas ocasiões o termo denota claramente uma virgem, mas tem sempre o significado de jovem mulher em idade de se casar, sem referência à virgindade. Nesse sentido, eles apontam que o termo técnico para virgem é bethulah, que ocorre mais de 50 vezes. Entretanto, essa argumentação não é convincente, uma vez que o termo ‘almah aparece em Genêsis 24:43 em referência a Rebeca, com o claro propósito de indicar seu estado de pureza. Ali o termo é associado a na’ar, que indica sua idade; bethulah indica o fato de que ela é solteira. Adicionalmente, ‘almah nunca é usada na Bíblia hebraica para uma mulher casada. Bethulah, ao contrário, é usada em Joel 1 para uma mulher que chora por seu ba’al, um dos termos hebraicos para marido. Por fim, o termo ‘almah é encontrado na literatura ugarítica com o significado de virgem, em paralelo com o termo equivalente a bethula.

Em resumo, não é correto se dizer que o termo signifique apenas uma jovem, retirando a fundamentação da interpretação messiânica feita por Mateus. De fato, a construção narrativa, associada à narrativa de Rebeca, o casamento com Isaque e a consequente continuidade da promessa a Abraão, nos chama a considerar o evento como a intervenção miraculosa de Deus, maior que a mera demonstração temporal e circunstancial para Acaz. De fato, o sinal de Deus não foi para Acaz, mas para o povo, referenciado aqui como no plural: “Adonai dará a vocês um sinal”. Esse sinal é a continuidade “futura” do Reino, para além dos tempos da batalha atual que causava em Acaz um temor paralisante: seu tempo estava por terminar, mas Judá continuaria.

Emanuel

Resta-nos, por fim, identificar o próprio Emanuel. Se é correta a sugestão de identificação da mãe de Emanuel como uma virgem, em sentido restrito, ou como uma mulher ainda não casada, imediatamente a profetisa, esposa de Isaías, e a rainha, esposa de Acaz, deixam de ser alternativas válidas, pois já estavam casadas e não mais eram virgens. Consequentemente, seus filhos tampouco estão qualificados para cumprir a função de Emanuel. Shear-Jeasub, filho de Isaías, já era uma criança, e Ezequias, filho de Acaz, provavelmente já devia estar com 9 anos. É inútil tentar encontrar nos tempos de Isaías, ou mesmo nos tempos imediatamente posteriores, qualquer cumprimento dessa profecia em alguma mulher e seu filho. Por isso, somos deixados apenas com a interpretação messiânica que, de fato, se encaixa com o propósito maior da profecia: indicar a continuidade do reino davídico para além do tempo de angústia vivido por Judá e da apostasia de Israel, e confirmar que Deus não estava distante de Seu povo, ainda que Seu povo estivesse distante Dele. O nome Emanu’el diz exatamente isso: apesar de todos os pecados do povo, Deus ainda estaria com ele, uma vez que Ele permanece sempre fiel à Sua aliança. A guerra viria e passaria, viriam tempos de paz, e novos tempos de dor, mas Ele seguiria com eles e faria Sua presença perceptível no futuro, através da criança Emanu’el.

Na próxima semana, retomaremos esse estudo para entender como o Emanuel divino Se encaixa nas palavras dos versos 15 e 16.

Pr. Sérgio Monteiro